sábado, 1 de dezembro de 2018

Sociólogo acusado de instrumentalizar revista científica para defender tauromaquia



Artigo que relaciona "atividade tauromáquica" de cada zona do país com taxa de criminalidade para concluir, "inquestionavelmente", que assistir a touradas não tem consequências negativas em crianças está no centro de uma crise na revista de Sociologia do ISCTE, cujo diretor é acusado de "fraude científica".
Fernanda Câncio


"O respeito pela verdade e pelos factos é essencial. Cada um tem a sua opinião, mas a opinião vale o que vale. E por isso é que apelamos aos estudos científicos e àquilo que a ciência tem para nos ensinar, porque a ciência supera aquilo que cada um acha. A ciência tem um discurso sobre a verdade e tem de ser respeitado."
Este foi o introito que Luís Capucha, professor de Sociologia no ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa e assumido aficionado, fez no Prós & Contras da RTP no qual se debatia o IVA da tauromaquia antes de mencionar "um artigo científico publicado numa revista científica de Sociologia" que permitiria refutar "aquela tese que os anti-taurinos utilizam a respeito das crianças e dos malefícios que a tauromaquia faz às crianças." Para tal, explicou, "os autores cruzaram o índice de atividade tauromáquica com o índice de criminalidade e de poder de compra, para ir ver se há alguma relação entre a violência e a presença da tauromaquia e se há ou não alguma relação entre o desenvolvimento e a tauromaquia."
E há?, perguntou a moderadora. Capucha, que vive em Vila Franca de Xira, um concelho ribatejano conhecido pela atividade tauromáquica, e é desde 2016 presidente da Associação de Tertúlias Tauromáquicas de Portugal, foi taxativo: "Não há relação nenhuma. Se a tese dos antitaurinos fosse verdadeira, nós não conseguiríamos viver nos nossos concelhos, porque seriam tão violentos, tão mais violentos que em todos os outros sítios, que ninguém conseguiria sobreviver. Portanto esse argumento é completamente falacioso.
"Se a tese dos antitaurinos fosse verdadeira, nós não conseguiríamos viver nos nossos concelhos, porque seriam tão violentos, tão mais violentos que em todos os outros sítios, que ninguém conseguiria sobreviver. Portanto esse argumento é completamente falacioso."
Ninguém perguntou qual a revista que publicara o artigo e quem são os autores; o mesmo tinha sucedido três dias antes na SICN, num debate versando o mesmo assunto e no qual o sociólogo tinha citado o dito estudo. Assim, Capucha não teve de esclarecer ser um dos autores e diretor da revista que o publicara -- a Sociologia, Problemas e Práticas, revista do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia do ISCTE.
Questionado pelo DN sobre o motivo pelo qual não assumiu a paternidade do artigo nem o facto de dirigir a revista que o publicou, o sociólogo, cujos "principais temas de pesquisa", de acordo com o seu currículo no
 site do ISCTE, "são as políticas de luta contra a pobreza e a exclusão social, as políticas sociais, as políticas de educação e de formação, as culturas populares, a reabilitação de pessoas com deficiência e as metodologias de planeamento e avaliação", tendo desempenhado vários cargos públicos (diretor-geral do Departamento de Estudos, Prospetiva e Planeamento do Ministério do Trabalho e Solidariedade Social de 1998-2001; diretor-geral da Direção-Geral de Inovação e Desenvolvimento Curricular do Ministério da Educação de 2006 a 2008; presidente da Agência Nacional para a Qualificação, responsável pelo Programa Novas Oportunidades, de 2008-2011; membro do Comité de Emprego da União Europeia), diz que "a questão da autoria era irrelevante naquele contexto e ninguém perguntou."

Artigos publicados e despublicados

As coincidências não ficam por aqui. Menos de duas horas após o final do P&C, ou seja, perto da uma da manhã de terça 20 de novembro, vários sociólogos que haviam submetido artigos para publicação na revista em causa, que sai três vezes por ano, receberam um email no qual eram notificados de que o seu artigo fora publicado on line, "ahead of print", ou seja, em pré-publicação, antes da edição impressa.
De facto, no site da revista encontraram vários artigos publicados, com data de 15 de novembro. Entre eles, aquele que o diretor referira na TV nos debates de 16 e 19 como tendo sido "publicado numa revista científica" -- Tauromaquia, Violência e Desenvolvimento - Opiniões e Evidências -- no qual consta como o primeiro de três autores.
Mas aquilo que à partida pareceria uma boa surpresa para os destinatários do mail - alguns tinham submetido os artigos há mais de um ano e as publicações fazem falta no curriculum e são relevantes para concursos e candidaturas - causou perplexidade e indignação.
Menos de duas horas após o final do Prós
Não só por os autores terem sido avisados cinco dias após a publicação, mas sobretudo porque ser publicado numa revista científica indexada internacionalmente, como é o caso desta, implica um sistema de certificação e verificação que se processa através de "revisão por pares", ou seja, especialistas da mesma área: os artigos são enviados, sem identificação dos autores, para outros cientistas, que os apreciam e fazem reparos ou sugestões que por sua vez seguem, também sem referência à identidade de quem os fez, para os autores, para que estes procedam aos ajustes e correções necessários.
Chama-se a este procedimento "double blind", ou seja, "cegueira dupla", porque uns não sabem quem são os outros, e é considerado fundamental na credibilização da divulgação científica. Acrescia que os artigos em causa foram colocados on line sem revisão de texto nem formatação final, ou seja, estavam em formato "manuscrito", apresentando até "marcas de revisão, gralhas e outros erros", segundo autores.
Considerando que a publicação sem peer review punha em causa a integridade científica dos artigos e a credibilidade da revista, vários autores enviaram, na quarta 21, um "pedido de esclarecimento formal" à direção editorial da revista. Neste, perguntavam se os artigos tinham sido alvo de revisão científica, por que motivo não tinham sido notificados de que os artigos tinham sido aceites para publicação e não tinham tido ocasião de fazer uma revisão final de texto, e, por fim, como funciona afinal o sistema de revisão científica da revista.
Na sexta 23, os autores do pedido de explicações foram notificados de que os artigos tinham sido retirados. A justificação foi de que não estavam "devidamente formatados", adiantando que "logo que estejam devidamente formatados todos os artigos, caso os autores explicitamente não se oponham, voltaremos a editá-los no prelo." As perguntas não foram respondidas.
Considerando que a publicação sem revisão por pares punha em causa a integridade científica dos artigos e a credibilidade da revista, vários autores enviaram, na quarta 21, um "pedido de esclarecimento formal" à direção editorial da revista, perguntando se os artigos tinham sido alvo de revisão científica, por que motivo não tinham sido notificados de que os artigos tinham sido aceites para publicação. Dois dias depois os artigos foram retirados.
Ao DN, porém, Luís Capucha esclareceu, por escrito, qual o sistema de revisão científica em vigor na revista: "Quando um artigo é submetido, ele é analisado pelo Conselho de Redação (CR) que, de três uma: ou decide aceitar; ou remete para revisão por parte de dois ou três peritos, ou rejeita. No segundo caso, o único que se tem verificado, há peritos convidados a rever que não estão disponíveis, sendo por isso necessário convidar outros. Os pareceres podem demorar algum tempo a chegar, embora a revista automaticamente emita reforço do pedido de revisão após três semanas de espera. Os pareceres dos dois ou três peritos podem ou não ser coincidentes, e podem ser, genericamente, do seguinte tipo: publicável como está; publicável com pequenas alterações, que são especificadas; publicável com grandes alterações, também especificadas; não publicável, com a devida justificação."
Nos casos em que os pareceres "são no sentido de "publicável"", explica Capucha, "com pequenas ou com grandes alterações, as recomendações dos peritos são enviadas aos autores, que decidem se querem ou não proceder às alterações. Se o fizerem, submetem novamente o artigo, que é reenviado aos peritos para verificar a conformidade. Nos casos em que estes não se dão por satisfeitos, normalmente o CR rejeita os artigos. Nos casos em que recomendam a publicação, o CR decide geralmente aprovar."
Mas, sublinha o atual responsável da revista, "A última palavra é sempre do Diretor e do CR, que têm em conta os pareceres dos peritos revisores. De todas as rejeições, como das aceitações, é dado conhecimento aos autores."
Uma vez aprovado, prossegue Capucha, "o artigo fica a aguardar a sua vez para ser publicado. Por exemplo, podemos estar neste mês a aprovar artigos que só terão lugar num número a publicar em 2020. Por isso se criou, no âmbito da política de ciência aberta, este procedimento do Ahead of Print. No fundo, o artigo está aceite, não está definitivamente publicado num número da revista, mas pode ser acedido e entrar no circuito de divulgação da ciência."
Assim, explica, "o que foi colocado on line, em Ahead of Print (no Prelo) foram os artigos que estavam aprovados na data da última reunião do Conselho de Redação, alguns dos quais poderão só vir a ser editados na versão definitiva em 2020."

Regras da revista violadas?

Sobre a existência ou não de revisão científica de todos os artigos publicados "ahead of print", porém, Luís Capucha não é claro: "Se os autores não receberam indicações de peer review (revisão pelos pares), foi porque os seus artigos foram aceites para publicação sem sugestões de correção. Com a mensagem recebida no dia que refere [20 de novembro], os que não sabiam ficaram a saber que o seu artigo tinha sido aceite para publicação, numa data ainda a determinar pelo Conselho de Redação em função da data de aprovação e de critérios editoriais como, por exemplo, a temática que abordam. Embora o Diretor tenha a autoridade suficiente para aprovar artigos, nenhum, no meu mandato ou no anterior, que eu saiba, foi aprovado sem a devida revisão pelos pares."
A utilização do condicional por Luís Capucha implica que não sabe se os artigos publicados on line tiveram ou não revisão científica; ora, nesse caso, como poderia ter decidido publicá-los?E como pode, sendo diretor, alegar não saber? É a editoria da revista que faz a ponte entre autores e "árbitros", e, como o próprio Capucha explicou ao DN - "A última palavra é sempre do Diretor e do CR, que têm em conta os pareceres dos peritos revisores. De todas as rejeições, como das aceitações, é dado conhecimento aos autores" -- a decisão de publicar os artigos depende do feed back dos revisores científicos. Logo, de acordo com as regras, não poderia ter decidido publicar os artigos sem conhecer as revisões.
E, como os membros da academia contactados pelo DN certificam, não só é raríssimo não haver sugestões de correção ou quaisquer observações, como mesmo que fosse o caso os autores receberiam sempre a notificação da revisão.
"O que os senhores dizem que "provaram" não podia ser sequer testado com os indicadores que escolheram (que raio de referees [revisores científicos] deixam isto passar em claro?). Instrumentaliza-se a sociologia e uma revista de que se é diretor para fazer valer um ponto de vista interessado."
Ora vários dos artigos publicados no dia 15 de novembro, "ahead of print", foram submetidos para integrar um número temático da revista sobre questões de família e género. Esse número tem duas editoras "convidadas" - Karin Wall, diretora do Instituto de Ciências Sociais, e Maria das Dores Guerreiro, anterior diretora da revista e atual vice-reitora do ISCTE. A primeira admitiu ao DN que o processo de revisão científica dos artigos em causa ainda não está terminado, ou seja, não havia de facto ainda peer reviews desses artigos.
Além disso, certifica Wall, "os autores recebem sempre um feed back da revisão, tinham de ser notificados". Sobre as circunstâncias da publicação, prefere não se alongar: "Não soube, não fui avisada antes. Esta é uma revista muito importante para a comunidade científica, que prezo muito. Confio no ISCTE e no Centro de Sociologia para resolverem a questão."
O DN não teve possibilidade de confrontar Luís Capucha com esta informação, já que este não voltou a responder a mails ou mensagens ou a atender chamadas do jornal após sexta 23.
"Não soube da publicação, não fui avisada antes. Esta é uma revista muito importante para a comunidade científica, que prezo muito. Confio no ISCTE e no Centro de Sociologia para resolverem a questão."
Nesse dia o sociólogo tinha acabado por reconhecer, em conversa telefónica, que "publicar os artigos daquela forma pode ser considerado um lapso", e comprometeu-se a enviar ao DN a revisão "por pares" do artigo de que é autor, assim como a especificar a data da sua aprovação para publicação e de quem foi essa decisão. Nas respostas escritas, antes dessa conversa, tinha adiantado que "a revisão pelos pares indicou que o artigo era publicável com alterações significativas. Foram realizadas, e os revisores ter-se-ão dado por satisfeitos, porque a indicação que recebi depois é que o artigo, na versão revista, foi aprovado" mas declarou não poder disponibilizá-la alegando que "não é possível ter acesso às revisões, dados os processos de "double blind review".
Apesar de ter sido relembrado várias vezes do compromisso de envio da peer review, Luís Capucha não a disponibilizou, nem esclareceu a data em que o artigo foi aprovado para publicação nem de quem foi a aprovação.

"Artigo é uma fraude científica"

A existência de revisão científica do artigo que Capucha assina em co-autoria com Luís Pereira e Tiago Tavares (identificados, respetivamente, como "mestre em Economia Política" e "mestre em Finanças") e a identificação de quem o aprovou para publicação tem particular relevo porque sociólogos contactados pelo DN - a maioria preferindo não ser identificada - não têm dúvidas em classificar as correlações estabelecidas no artigo como "sem pés nem cabeça" e "não permitindo tirar qualquer conclusão, para um lado ou para outro", para além de se espantarem com o tom belicoso - há referência repetida a "argumentos dos antitaurinos" -- e com a irredutibilidade das conclusões.
Há mesmo quem caracterize o artigo como "travesti de ciência" e "fraude científica". Neste último caso está João Sedas Nunes, professor no departamento de Sociologia da Universidade Nova.
Sedas Nunes reagiu logo no dia 20, no Facebook, à tese expendida por Capucha no Prós & Contras: "O que os senhores dizem que "provaram" não podia ser sequer testado com os indicadores que escolheram (que raio de referees[revisores científicos] deixam isto passar em claro?). Instrumentaliza-se a sociologia e uma revista de que se é diretor para fazer valer um ponto de vista interessado." Voltou à carga a 23 de novembro, ao partilhar um artigo de António Guerreiro, no Público, intitulado "O Púlpito dos charlatões", e no qual o articulista refere a participação de Luís Capucha no P&C em termos particularmente duros, descrevendo-o como "o sociólogo, o aficionado, o propagandista e o inimigo do saber, tudo na mesma pessoa", considerando que tal "só na televisão é que é possível."
Comentou Sedas Nunes: "Não é nada de pessoal. É só negócio, o da integridade da sociologia. Quando alguém, de púlpito, puxa dos galões da ciência e da sociologia, omitindo entre o mais que a ciência em que se guarda é a sua própria ciência timbrada na revista de que é diretor, para, com ou sem dolo, faltando grosseiramente à verdade e fazendo tábua-rasa do próprio conhecimento sociológico, propagandear um ponto de vista eminentemente político, torna-se-me imperativo reagir com firmeza. Calar perante a impostura é ser cúmplice da desqualificação pública da Sociologia enquanto ciência que a sua (despudorada) instrumentalização para fins políticos constitui."
"Não é nada de pessoal. É só negócio, o da integridade da sociologia. (...) Calar perante a impostura é ser cúmplice da desqualificação pública da Sociologia enquanto ciência que a sua (despudorada) instrumentalização para fins políticos constitui."
Ao DN, e após ler "até ao fim, com enorme esforço (e bastante irritação)", o artigo em causa, o professor da Nova aprofunda a análise sobre o que classifica como "uma fraude científica nos três níveis em que o juízo se pode realizar".
E elenca: "O epistemológico -- se, como os autores esclarecem, a questão é apenas mostrar que um certo ponto de vista político é uma mera opinião sem fundamento, então a prova que realiza e a conclusão que produz inscrevem-se em exclusivo no espaço das asserções políticas (não no das científicas); Teórico -- sendo quase omisso quanto a teoria, quando lhe recorre abusa. Nada nas teorias da socialização que são invocadas autoriza "afirmar que se no passado as crianças tivessem sido afetadas pelo contacto com a violência das festas taurinas e com as suas estruturas culturais, supostamente anacrónicas, isso se refletiria nas práticas e representações que são produto das disposições incorporadas e dos processos de socialização dos adultos abrangidos pelos dados estatísticos relativos aos níveis de consumo e às taxas de criminalidade, que não deixariam de as refletir.""
Isto, diz, "já para não notar o absurdo lógico de afirmar uma conjetura - que se entende porque todo o texto está redigido dentro de uma economia de argumentação política em que se dispensa a prova empírica do juízo de facto; metodológico -- nada, mas mesmo nada no conhecimento científico-social - sociológico, antropológico, mas também económico (um dos autores é pelos vistos economista) -, nada, mas mesmo nada do que se sabe dos processos a que o texto se refere permite a conceptualização que os autores elaboram da noção de "mal-estar físico e mental das crianças" e todas as operações de equivalência lógica que essa conceptualização contém."
Porque, frisa, "é preciso não perder de vista (e é fácil perdê-lo) que a "criminalidade" é, no modelo de estudo construído, no fundo indicador de perturbação do "bem-estar físico e mental das crianças envolvidas nos espetáculos tauromáquicos e representações associadas, bem como com o bem-estar mental e emocional das crianças que como espetadores estão expostas à violência das touradas" e "o seu potencial efeito no desenvolvimento das crianças." Por outras palavras, a "criminalidade" mediria a perturbação do bem-estar físico e mental das crianças."
A "criminalidade" é, no modelo de estudo construído, no fundo indicador de perturbação do "bem-estar físico e mental das crianças envolvidas nos espetáculos tauromáquicos, bem como com o bem-estar mental e emocional das crianças que como espetadores estão expostas à violência das touradas". Por outras palavras, a "criminalidade" mediria a perturbação do bem-estar físico e mental das crianças. Como é que se chega a esta indexação? Através de um conjunto de sucessivas conexões articuladas sem qualquer base teórica, empírica ou sequer lógica."
E Sedas Nunes pergunta: "Como é que se chega a esta indexação? Através de um conjunto de sucessivas conexões articuladas sem qualquer base teórica, empírica ou sequer lógica: a) primeiro, sintetiza-se aquelas premissas na seguinte: que a experiência taurina "tem efeitos psicológicos negativos para o crescimento psicologicamente equilibrado das crianças"; b) em segundo lugar, transformam-se estes efeitos em "violência", e especificamente em violência não como experiência mas enquanto conduta/prática, quer dizer, afirma-se que uma criança exposta a violência e, como resultado disso, sujeita a "perturbações psicológicas" será sujeito de violência; c) em terceiro lugar, por fim a "violência" transmuda em "criminalidade.""
Para tornar claro o que vê como uma cadeia de conexões sem sentido, o sociólogo vira-a ao contrário: "Vendo estas operações ilógicas inversamente, para os autores, a criminalidade é um indicador de violência, que, por seu lado, é uma expressão rigorosa de "perturbações psicológicas", que, finalmente, é o estado consolidado na idade adulta do "mal-estar infantil", tudo isto enquanto presumem o velho princípio (igualmente muito discutível) da economia ceteris paribus [tudo o resto permanecendo constante] para concluírem que a "demonstração de ausência de correlação desmente os argumentos antitaurinos de forma inquestionável" (isto aqui não é uma simples muleta retórica do argumento, é o remate coerente de um objeto que, de facto, participa de uma luta política entre prós e anti-taurinos, ao menos tal como ela é imaginada por aqueles)."

A "leviandade" da ONU

De relevar, por outro lado, que na literatura citada pelo artigo não figura qualquer estudo especificamente sobre o objeto que este supostamente visa analisar - o efeito nas crianças da assistência a espetáculos taurinos. Poder-se-á concluir dessa ausência de referência que esses estudos não existem, mas há pelo menos quatro, comissionados, em 1999, pelo então Defensor del Menor de la Comunidad de Madrid, Javier Urra, a peritos - incluindo sociólogos -- de várias universidades espanholas.
Em causa neste pedido de investigação estava a decisão, tomada em 1998, na Catalunha, de proibir a assistência de touradas a menores de 14 (em 2010 a região, por decisão do parlamento, proibiu as touradas, na senda da decisão no mesmo sentido das Canárias, em 1991; a decisão foi em 2016 considerada sem efeito pelo Tribunal Constitucional espanhol).
Os estudos foram coordenados por Enrique Echeburúa, catedrático de Psicologia da Universidade do País Basco; pelo menos um deles viria a ser publicado autonomamente em 2004. E se concluem pela inexistência de provas científicas de que assistir àquele tipo de espetáculos cause, em geral, "uma interferência emocional negativa nas crianças", não são inteiramente tranquilizadores, alertando para que a conclusão só vale "quando se trate de crianças psicologicamente sãs e que assistam a esses espetáculos esporadicamente, voluntariamente e acompanhadas de adultos que tenham uma atitude positiva face à corrida."
Uma conclusão dos estudos é de que a maioria das crianças de uma das amostras - 240, entre os oito e os 14 anos - não gostavam de touradas e 60% achavam-nas "violentas" e entre 30 e 50% consideravam-nas maus tratos aos animais, sendo 66% contra a morte do touro.
Reconhece-se porém que "em alguns casos as crianças podem mostrar algumas manifestações emocionais de nervosismo e preocupação, especialmente quando o animal demora muito tempo a morrer [em Espanha os touros são mortos na arena] ou quando há uma colhida, mas estes sintomas são transitórios e não têm mais importância que as reações experimentadas depois de assistir a um filme de terror na TV." E que pode haver perigo para crianças "com uma psicopatologia clínica específica - transtornos de ansiedade e depressão --, assim como para aqueles que possuam maior vulnerabilidade (muito sensíveis ou muito impulsivos), que não devem assistir às corridas. Tão-pouco são aconselháveis a crianças que tenham uma atitude ecológica extrema de proteção dos animais." Uma conclusão dos estudos é de que a maioria das crianças de uma das amostras - 240, entre os oito e os 14 anos - não gostavam de touradas e 60% achavam-nas "violentas" e entre 30 e 50% consideravam-nas maus tratos aos animais, sendo 66% contra a morte do touro.
Existe ainda pelo menos um "comentário técnico" da Ordem dos Psicólogos Portugueses, intitulado "Impacto Psicológico da Exposição das Crianças aos Eventos Tauromáquicos", datado de junho de 2016, efetuado a pedido do Partido Animais e Natureza, no contexto do debate sobre o projeto de lei deste partido, apresentado em 2016, visando proibir a assistência de menores de 18 anos a touradas.
"O Comité da ONU ao recomendar, levianamente, medidas de sensibilização sobre a violência física e mental associada às touradas [recomendação de 2014], abre caminho a um possível ataque à diversidade cultural que a UNESCO tanto defende, ao mesmo tempo que atenta contra a dignidade e continuidade das "nossas" práticas culturais."
Curiosamente, no site do parlamento, e presume-se que a propósito da discussão do citado projeto de lei do PAN, encontra-se não só o resumo dos estudos espanhóis citados mas também uma versão anterior, não datada e mais abreviada, do artigo de Capucha, Pereira e Tavares. Nesta, porém, o primeiro autor é Luís Pereira (autor de uma dissertação de mestrado orientada por Capucha, no ISCTE, em 2010 na qual correlaciona o índice de atividade tauromáquica com o índice de desenvolvimento, concluindo com um manifesto pela reintrodução no país da corrida de morte: "Os aficionados portugueses das corridas integrais, por uma questão de justiça, devem poder exercer um direito cultural, ou seja, devem poder participar neste tipo de rituais em Portugal. (...) É tempo de devolver aos portugueses a liberdade de legalmente assistirem na sua terra a uma representação cultural na íntegra e não só a um mero simulacro. Na corrida de toiros os animais bravos são os adversários dos homens, num combate ritualizado entre a cultura e a natureza, que em regra e com regras, deve finalizar com o Homem dominando as forças da natureza, ato este representado pela morte do touro no lugar da lide, a arena.").
Com o título "Atividade Tauromáquica Versus Indicadores de Violência e Desenvolvimento", o artigo encontrado no site do parlamento estabelece o mesmo tipo de correlação da versão posterior e tem a mesma conclusão: "A demonstração de ausência de correlação desmente os argumentos anti-taurinos de forma inquestionável." Termina com um ataque à ONU: "O Comité da ONU ao recomendar, levianamente, medidas de sensibilização sobre a violência física e mental associada às touradas [recomendação de 2014], abre caminho a um possível ataque à diversidade cultural que a UNESCO tanto defende, ao mesmo tempo que atenta contra a dignidade e continuidade das "nossas" práticas culturais. Desconhece-se quais as medidas de sensibilização que o Comité pretende implementar, mas sejam quais forem é obrigatório que os Direitos Fundamentais das comunidades, Constitucionalmente protegidos, sejam respeitados e que os valores culturais possam continuar a ser transmitidos."

A "paixão inescapável" da afición

A Convenção da Unesco para a Salvaguarda do Património Cultural Imaterial foi, precisamente, invocada na candidatura, em 2017, de um projeto liderado por Luís Capucha ao Orçamento Participativo com o objetivo de "inserir a cultura tauromáquica na lista de Património Cultural Imaterial de Portugal".O projeto é um dos 38 aprovados através de votação pública, recebendo uma dotação de 200 mil euros, e foi objeto de uma encomenda ao Centro de Investigação e Estudos de Sociologia do ISCTE, tendo Luís Capucha sido nomeado o coordenador académico do mesmo.
De acordo com o próprio, em entrevista ao jornal i, "o ISCTE-IUL recebeu uma encomenda da Direção Geral do Património Cultural no sentido de executar os trabalhos conducentes ao cumprimento do projeto aprovado no quadro do referido Orçamento Participativo. O trabalho, cujo âmbito é estritamente científico, está sediado no Centro de Investigação e Estudos de Sociologia do ISCTE-IUL".
"Revela um engajamento relevante da sociologia com agendas sociais e políticas específicas e particularistas, bem conotadas ideológica e partidariamente, e uma correspondente desresponsabilização em relação aos grandes problemas sociais das sociedades dos nossos tempos."
O concurso para os bolseiros que trabalharão no projeto decorreu até setembro último, tendo sido contratados quatro investigadores; em outubro, foi notícia uma pergunta do PAN sobre financiamento direto do ISCTE - e portanto público - para a promoção da tauromaquia, baseando-se no contrato assinado pelo instituto para a prossecução do projeto e no qual figuraria uma verba de 10 mil euros, em ajuste direto, para a realização de um documentário sobre o tema. Luís Capucha negou que tal fosse verdade, reputando de "erro" essa menção do contrato e assegurando, em entrevista à Lusa, "o rigor e qualidade científica do CIES neste como noutros projetos" e garantindo que "não há um ponto de vista ou orientação prévia para a recolha de material e elaboração da candidatura, e que as visões contrárias serão incluídas no trabalho que vai olhar para a tauromaquia no seu conjunto, incluindo as diferentes perspetivas a respeito da festa de toiros".
Como já foi dito, o DN não conseguiu voltar a falar com Luís Capucha desde 23 de novembro, pelo que não foi possível confrontá-lo com as escolhas bibliográficas do seu artigo, com as análises de colegas ouvidos pelo DN, com o facto de uma versão anterior do artigo figurar no site do parlamento português ou com a aparência de conflito de interesses na acumulação da promoção de um projeto de defesa da tauromaquia e do lobbying para a aprovação do mesmo com a coordenação científica desse projeto num instituto público.
Em setembro, Capucha escrevera no blogue Café Vila Franca uma reflexão sobre a Sociologia e o seu devir, intitulada "Preocupado com o presente e o futuro da sociologia em Portugal", na qual criticamente refere os temas das bolsas de doutoramento concedidas pela Fundação de Ciência e Tecnologia na área da Sociologia, concluindo: "Esta lista revela um engajamento relevante da sociologia com agendas sociais e políticas específicas e particularistas, bem conotadas ideológica e partidariamente, e uma correspondente desresponsabilização em relação aos grandes problemas sociais das sociedades dos nossos tempos."
não podia deixar de ser "Não poderia deixar de ser um vilafranquense, nem que quisesse. Ser aficionado é trazer consigo uma paixão da qual não se consegue (pelo menos não imagino como) escapar."
Num outro artigo, publicado na revista AntHropológicas (da Universidade Fernando Pessoa), em 2013, Capucha tinha escrito: "Julgo ter aprendido a distanciar-me da visão etnocêntrica com o auxílio da teoria sociológica, mas não podia deixar de ser um vilafranquense, nem que quisesse. Os meus interesses de pesquisa viraram-se para os temas da pobreza, das políticas sociais, do emprego e da educação e para as metodologias de planeamento e avaliação. Mas ser aficionado é trazer consigo uma paixão da qual não se consegue (pelo menos não imagino como) escapar."
O DN também procurou obter de João Sebastião, diretor do Centro de Sociologia do ISCTE, que edita a revista que Luís Capucha dirige, e de Maria das Dores Guerreiro, anterior diretora da revista e atual vice-reitora do instituto, comentários e esclarecimentos sobre esta polémica, tendo sido enviados mails para os dois com perguntas. Ambos estavam, aliás, por iniciativa de Luís Capucha, entre os destinatários das respostas que enviou ao DN a 23 de novembro. Nenhum dos dois académicos respondeu até ao fecho deste texto.》


Fonte:
https://www.dn.pt/pais/interior/sociologo-acusado-de-instrumentalizar-revista-cientifica-para-defender-tauromaquia-10264241.html

domingo, 1 de julho de 2018

Alberto Mesquita não sabe fazer contas aos (não)apoios

O dinheiro público para a tauromaquia em VFX é bem mais que os 270.000,00 € referidos.

 A somar a isto temos os 6.000,00 € que a junta de freguesia de Vila Franca de Xira entrega anualmente à "escola" de toureio. Depois há vários custos indirectos não contabilizados, são os apoios logísticos.
São funcionários municipais "desviados" das suas tarefas de serviço público para estar a montar e desmontar eventos tauromáquicos. Ou para estarem a tratar materiais de exposição de tertúlias tauromáquicas.

É o combustível para essas deslocações e para levar meia dúzia de gente à herdade onde se alugam os touros. São os materiais de comunicação. São taxas de publicidade e de emissão de ruído não cobradas a quem cola cartazes por todos o lado, deixa reboques nos passeios e anda com carros velhos a anunciar touradas e poluir a cidade, é mesmo muito mais.

Só quem está cá sabe... e nós sabemos!!!



《Alberto Mesquita revela que “em termos globais, existe um investimento anual de cerca de 270.000,00 €” na tauromaquia, em Vila Franca de Xira, numa entrevista, feita a todos os municípios que integram a Secção de Municípios com Actividade Taurina.


O seu município integra a rede de Municípios com Actividade Taurina. Qual a importância da tauromaquia para o município?

A Tauromaquia é um aspecto de extrema importância na afirmação da identidade de Vila Franca de Xira. A elevada participação popular em todas as iniciativas de âmbito tauromáquico, designadamente a Semana da Cultura Tauromáquica ou o Colete Encarnado, expressa de forma inequívoca o valor intrínseco da arte e cultura tauromáquicas no seio da nossa Comunidade. É muito mais do que apenas uma parte da nossa história; é um aspecto profundamente enraizado na nossa Cultura e marca aquilo que somos enquanto povo.



Como reage às manifestações e tentativas de acabar com a tauromaquia quer a nível nacional quer em termos internacionais por alguns grupos?

Consideramos que todos os pontos de vista são legítimos, desde que naturalmente se expressem de forma não-violenta e com respeito pelas demais opiniões divergentes. A democracia tem na sua essência princípios básicos de liberdade e de tolerância que devem ser respeitados acima de tudo. 


Como pode, e deve ser gerida esta questão entre os anti taurinos e os aficionados?

Precisamente, com respeito e bom senso, de todas as partes, pelas opiniões de cada um. 


Caso os Municípios venham a tutelar directamente o espectáculo tauromáquico, na sua óptica o que poderia mudar?

Importa sublinhar nesta matéria que o Município de Vila Franca de Xira, tal como outros Municípios com actividade taurina, tem vindo a afirmar reiteradamente que a Tauromaquia é uma tradição multissecular de âmbito nacional, sendo parte integrante do Conselho Nacional de Cultura desde 2010. A tauromaquia constitui, nas suas distintas e diversificadas manifestações, um património rico, vasto e singular da nossa cultura popular. E nessa medida, toda e qualquer legislação que venha a ser produzida neste âmbito deverá garantir a possibilidade de realização de corridas de toiros em todo o território nacional, no Continente ou nas Regiões Autónomas, sem qualquer excepção. Esta é uma matéria onde não deve existir margem para decisões singulares ou casuísticas em cada Município, que seriam nefastas para a coesão cultural nacional. Nessa medida, consideramos que a actual legislação não deve sofrer alterações e que não devem existir entendimentos diferentes, consagrados na lei, sobre o espectáculo tauromáquico enquanto manifestação cultural. É também por tudo isto que o Município de Vila Franca de Xira permanece empenhado na declaração da Tauromaquia como património imaterial nacional. 


Na sua ótica e para melhorar um espetáculo tauromáquico, o que se deve alterar?

Esta é uma questão que aponta para visões e sensibilidades muito particulares. Sendo que cada espetáculo tem as suas características próprias, penso que neste âmbito devem ser questionados directamente aqueles que realizam o espectáculo tauromáquico. A Câmara Municipal, tal como referido anteriormente, não tem nenhuma intervenção na componente artística do espectáculo tauromáquico. Os regulamentos que regem as touradas podem naturalmente ser revistos, por parte dos seus intervenientes mais directos, no sentido de dar, por exemplo, outras condições de ritmo ao espectáculo. O espectáculo taurino, tal como em qualquer outra manifestação artística, tem múltiplas manifestações e características, que também atraem diferentes tipos de público. E assim, para além das touradas existem esperas e largadas de toiros, existe a capeia arraiana no Sabugal, o toureio à corda nos Açores, e numa manifestação mais recente, o espectáculo dos Recortadores. São expressões da mesma paixão que também dão conta de uma cultura viva, em constante evolução, e de uma tradição que certamente não irá terminar por decreto.


Fonte: infocul.pt


DINHEIROS PÚBLICOS PARA A TAUROMAQUIA (EM CONSTANTE ACTUALIZAÇÃO) [Clique para descarregar o PDF]

segunda-feira, 7 de agosto de 2017

Largada e Espera de touros

Touros e cabrestos na "curraleta";
 recinto onde esperam depois 
de chegarem em camiões.
Touros encabrestados
 são guiados pelos campinos
 até à praça de touros.

🔴Esperas de touros, é um costume tauromáquico tradicional nas festas de muitas localidades e algumas cidades da região do Ribatejo, em Portugal.

Consiste na condução de uma pequena manada normalmente de seis touros bravos com hastes intactas, ou seja, "em pontas",  e vários cabrestos (bois mansos), conduzidos desde os campos,  encabrestados através das ruas das localidades, por campinos montados a cavalo, empunhando pampilhos(varas com arpão)

Os touros são encaminhados para uma Praça de Touros e depois fechados nos curros para serem posteriormente soltos numa largada.








🔴A largada de touros é um costume tauromáquico tradicional nas festas de muitas localidades de Portugal e também de alguns países da América Latina.

Consiste em largar touros bravos, um de cada vez, nas ruas das localidades, em percursos delimitados por tronqueiras para serem "lidados" por uma multidão de curiosos.
Estes toureiros improvisados servem-se por vezes de panos, peças de roupa e de vários objectos como guarda-chuvas, cartões, caixotes de papelão e até bidões, para provocar a investida do touro e também para se protegerem, tentando escapar às colhidas.

A restante multidão observa o espectáculo em segurança atrás das tronqueiras e outros locais protegidos por burladeros, servindo estes também como último refúgio aos que se aventuram a desafiar os touros.

As colhidas são uma constante durante o tempo que dura a largada, provocando muitas vezes ferimentos mais ou menos graves , e por vezes algumas mortes.

É tradicionalmente antecedida por uma Espera de touros, onde estes são recolhidos em currais para depois serem soltos um a um na Largada. Em muitos locais, não existe hoje a Espera pois os touros são transportados dos campos para o local da Largada em gaiolas transportadas em camiões.

Fotos largada em Vila Franca de Xira


sábado, 5 de agosto de 2017

As touradas VÃO ACABAR!


O que eles dizem não é a realidade. Esta prática só sobrevive com os subsídios e apoios da autarquia. Não há lucro!

“As touradas não vão acabar. Vejo os miúdos virem aqui fingir que estão a tourear”

《A tourada está novamente a provocar polémica, desta vez por causa das declarações de Daniel Deusdado, diretor de programas da estação pública, que afirmou que, apesar das boas audiências televisivas, o canal não vai transmitir mais corridas além das agendadas. O i foi medir o pulso à Moita e a Vila Franca


É fácil encontrar a praça de touros de Vila Franca de Xira. Para quem vem de Lisboa, a Praça de Touros Palha Blanco é a primeira coisa que se vê ao entrar na vila. Entalada entre a linha de comboio e o cemitério, a praça está, por estes dias, quase ao abandono: nesta zona não há sinais de comércio e até o restaurante e o museu etnográfico, que se encontram dentro do recinto, estão fechados, como nos explicou o arrumador de carros José Júlio – a única vivalma que por aqui se encontra. Também ele reconhece que esta zona está abandonada: “As pessoas só vêm cá quando há festas.”
Agora, a praça está impecavelmente pintada de branco e amarelo, mas José Júlio não esquece o dia em que manifestantes antitaurinos vandalizaram o recinto e, a vermelho, escreveram impropérios nas paredes e no monumento do toureiro que está à entrada. “Quem gosta, gosta. Quem não gosta, não venha porque não é bem-vindo”, desabafa.
Já no centro de Vila Franca, começa- -se a ver vida. Cada montra ou pedaço de parede livre é aproveitada para colar cartazes taurinos, com largo destaque para as festas de Coruche, Alverca e Alcochete, que se avizinham. Nas ruas há tábuas a proteger portas e janelas das marradas dos animais.
Alice Lambuça já vende artigos tauromáquicos na sua pequena loja há mais de 30 anos e não tem dúvidas de que, por aqui, o negócio tem sido sempre a piorar: “De há 30 anos para cá, há menos negócio aqui para a loja. A crise é grande e talvez esses senhores que andam a apregoar aí essas coisas também tenham ajudado…”, diz, referindo-se às associações de defesa dos animais e antitouradas.
Nascida e criada em Vila Franca de Xira, Alice habituou-se a ir ver as touradas desde miúda e agora é com pena que vê a tradição a ser atacada: “A tourada é cruel? Há muita coisa cruel. Mata-se porcos, mata-se frangos… eu não acredito que eles sejam todos vegetarianos. Palavra de honra, não acredito. Isso é coisas de meninos parvos. Alguns nem sabem o que é um touro”, refere, sem largar o pedaço de tecido verde que vai cosendo.
“As touradas não vão acabar, com certeza. Então eu vejo os miúdos a virem aqui comprar roupa para forcados. Alguns chegam aqui e começam a brincar com os panos de cozinha, a fingir que estão a tourear”, diz, já a sorrir.
Alice vende tudo, desde os sapatos do campino até ao barrete, “tudo feito à mão”. Um traje completo de campino custa 445 euros. Mas nem as touradas têm ajudado o seu negócio, só as festas: “Para os comerciantes, não faz grande diferença haver corrida ou não, as pessoas que vêm só para as corridas não vêm fazer compras. Quando há as festas do Colete Encarnado e da feira, aí sim, já se nota mais gente. Nos dias de festa nota-se logo.”
Para Alice, a culpa também é da desertificação: “Vila Franca está a ficar deserta. Se houvesse mais iniciativas, ajudava a terra. Não digo só touradas, mas mais coisas. Nós vivemos essencialmente do Colete Encarnado e da feira. Até outubro, está parado. Nesta zona da praça de touros ainda é pior, há ali o cemitério, se calhar é por isso”, graceja.
Já Adelaide, dona do restaurante Espeto Real, não vê motivos para dramas. “Nos dias de tourada vêm muitos forasteiros. Nas festas, então, isto é uma loucura, estamos a falar de 70 ou 80 mil pessoas que bombardeiam Vila Franca”, refere com um sotaque transmontano. Nascida em Vila Real, mudou-se para esta zona há 39 anos. Em Trás-os-Montes ou Vila Franca, a paixão pelos touros é a mesma: no norte não perdia uma garraiada e aqui não perde uma largada.
“Touradas em vias de extinção? Aqui?! Aqui não!”, exclama, acrescentando: “Temos de manter as nossas tradições porque sem elas deixamos de ser portugueses.” O Campo Pequeno, em Lisboa, serve de comparação: “Sem a tourada, aquilo passa a ser o quê? O circo?”
E as opiniões fortes de Adelaide não se ficam por aqui: “Criamos os animais para os comermos e para nos divertirmos com eles. É verdade ou não é?”
Em relação à polémica da semana, Adelaide não tem dúvidas: “Claro que há discriminação contra as touradas. Então porque é que se transmite um jogo de futebol onde anda tudo à pancada? Na tourada, ninguém anda à pancada. Para o futebol há tantos milhões e para a tourada ninguém sequer quer transmitir na televisão.”
Mário, de 79 anos, orgulha-se de ser o talhante mais antigo do mercado municipal de Vila Franca de Xira. Encara-nos logo sem rodeios: “Então mas vocês são aficionados? Ou são daquelas organizações que vêm para aqui fazer barulho por causa dos touros?”
“Eu cá adoro ir às corridas. Quando era novo ia todos os dias às festas de Badajoz. Depois do almoço saía aqui do talho, pegávamos no carro e [desliza as mãos rapidamente uma pela outra] lá íamos ver as corridas de touros”, recorda. Agora, a saúde já não permite tais andanças.
Para o talhante, a tradição está a perder-se: “Os jovens já não vão muito aos touros.” Pessimista, explica: “Daqui a dez anos já não estou cá, mas a tourada é capaz de desaparecer. Agora está tudo parado, aqui o mercado de Vila Franca de Xira, que era um dos melhores, está neste estado [e mostra a paisagem quase desértica do mercado]. Está tudo a acabar. Aqui não têm iniciativa, não fazem nada…”
Opinião contrária tem Maria João Carraça, chefe da divisão de Cultura da Câmara Municipal de Vila Franca: “Somos um município que não para na produção de eventos.” A autarquia reconhece o peso dos eventos de cariz taurino: “O impacto das atividades taurinas em Vila Franca de Xira é bastante notório ao longo do ano e manifesta-se particularmente na Festa do Colete Encarnado e na feira anual. São eventos que trazem muitos milhares de pessoas, portugueses e estrangeiros. Evidentemente que isto é muito importante para o comércio.”
“De há dez anos para cá, estes eventos têm vindo a crescer e há um maior número de visitantes”, explica Maria João Carraça, acrescentando que a vila não está dependente da tauromaquia: “A vila tem outros polos culturais que também trazem muita gente, há público para tudo.”》



Fonte: 
I online

sexta-feira, 9 de setembro de 2016

A diferença entre touro, boi, vaca, garraio, bezerro e caresto.


Os Romanos receberam da língua grega a palavra tauros, que converteram em taurus. É desta última palavra que surgiram as formas touro e toiro.



 Touro é o macho adulto combativo e corpulento destinado frequentemente para lutas com os seus semelhantes ou às touradas. Antes dos combates e das touradas, são inteiros ou não castrados. Depois das touradas, alguns voltam ao campo. Na maior parte dos casos, são destinados ao abate.


 Boi é uma palavra derivada do vocábulo latino bove-. Designa os machos destinados aos trabalhos agrícolas ou para a produção de carne. A maior parte dos machos mansos destina-se ao abate e não passa de bezerros ou de vitelos.


 Em Portugal, as fêmeas dos touros são conhecidas como vacas bravas, e as fêmeas dos bois são designadas como vacas mansas.


Cabresto é o macho castrado que, em conjunto com outros, guia as manadas de touros ou de bois mansos. Nas touradas, os cabrestos conduzem os touros para fora das arenas.


 Bezerro é o filho de vaca e touro ou boi com menos de um ano de idade até ser desmamado.


 Vitelo é o filho de vaca e touro ou boi com cerca de um ano de idade.


 Novilho é o filho de vaca ou boi com mais do que um ano de idade. Usa-se com maior frequência em relação aos touros jovens.


 Garraio é o filho de vaca brava e touro enquanto jovem e antes de ser corrido nas touradas.

terça-feira, 6 de setembro de 2016

Ao ataque: 'bombásticas' e inesperadas...

Empresário Tauromáquico Ataca APET
 Rafael Vilhais publicou um post no Facebook onde afirma que a tauromaquia está podre e chama a Associação Portuguesa de Empresários Tauromáquicos de coveiro da festa.
E afirma também que há toureiros que pagam para tourear.
Mas que grande novidade, afinal ele só vem reafirmar aquilo que todo o mundo sabe, ou seja que há toureiros que pagam para tourear, ganadeiros que drogam bovinos, toureiros que drogam cavalos, forcados que pagam para abusar de animais e por aí fora já que entre esta gente e a máfia não existe qualquer diferença!
Prótouro
Pelos touros em liberdade

rafael vilhais post facebook

... declarações feitas por Rafael Vilhais, na sua página pessoal de Facebook, sobre a realização de Festivais Taurinos, fora do tempo acordado pelos membros da APET, procurou o TouroeOuro saber junto da Associação Portuguesa de Empresários Tauromáquicos, qual a posição da mesma face ao escrito que agitou o meio taurino.
Paulo Pessoa de Carvalho falou ao TouroeOuro...

A propósito das afirmações de Rafael Vilhais na sua página de Facebook e que passamos a citar 'A tauromaquia em Portugal não está doente, está podre!!! A Associação de Empresários 'APET' (de coveiros da festa) à qual eu infelizmente pertenço e que não me sinto representada por ela! Em Assembleia Geral neste início de 2016, em que acordámos que não eram permitidos Festivais Taurinos, entre as datas de 25 de Abril, em Sobral de Monte Agraço e terça-feira nocturna de Vla Franca, em plena temporada para não prejudicar os eventos das empresas, bem como dos toureiros chamados de profissionais??? Todo o contrário!!! Está tudo dito!! Eu no que me diz respeito, até já terminei a época, a actividade empresarial! Uma vergonha quando isto está a ser apoiado com gente que deveria ser responsável ou não? Desde empresários que pagam para tourear. Há que pôr o dedo na ferida! Eu nasci nisto! E quem não serve tem um caminho, la calle!'.

A este desabafo do novel empresário, responde no mesmo espaço, Ricardo Levesinho, visto que a ilustração a este post, se fazia com os cartazes dos festivais do fim-de-semana passado, Carregado (com organização a cargo da Tauroleve) e Alandroal. Diz o empresário que 'Rafael Francisco Vilhais você pode dizer o que entender já que estamos num estado de direito democrático mas utilizar as palavras que utilizou referindo se a artistas onde estão Vitor Mendes, Ana Batista, Antonio João Ferreira, Manuel Telles Bastos, Marcelo Mendes e Cuqui só para me referir ao Festival previsto a mais de um ano no Carregado (antes da deliberação ocorrida já este ano) e devidamente autorizada pela Direcção da APET penso que além de não ser correcto é algo injusto para quem colaborou desintressadamente a favor de uma paróquia que possui a sua responsabilidade valências de solidariedade. E para mim e para a minha empresa foi uma honra estar integrado neste projecto e repito totalmente dentro do respeito pelas instituições conforme solicitações devidamente formalizadas e aceites. Se tem dúvidas coloque a quem de direito pois tem toda a legitimidade para tal mas recomendava se me permite que use estas plataformas com o uso da informação correcta pois é tão fácil alavancarmos temas que depois provocam comentários que aqui já circulam e que em nada beneficiam ninguém. Nem mesmo de quem os provocou pois a Tauromaquia e a Festa como estamos ambos totalmente de acordo são superiores a interesses e protagonismos colectivos e pessoais. Um abraço Rafael e estou totalmente disponível para debater consigo onde e quando quiser pois tenho a honra de o respeitar e de sentir reciprocidade.'

Sobre o pertinente tema, procurou saber o TouroeOuro junto da APET, qual a sua posição face à inflamação e sobretudo, querendo obter um esclarecimento sobre a legitimidade ou não da realização de Festivais Taurinos durante o auge da temporada. Paulo Pessoa de Carvalho, Presidente da Associação Portuguesa de Empresários Taurinos, respondeu da seguinte forma, 'Perante o que me pergunta e que sinceramente não vi e não sei se vou ver, o que me constou foi que haveria criticas duras sobre a não união ou respeito dentro da APET sobre regras definidas e assumidas. Algumas pessoas falaram-me sobre o que o Rafael Vilhais escreveu e sobre alguns infelizes comentários a esse texto. O que sei, é que recebi um telefonema do Rafael Vilhais ontem, a dizer-me que o que tinha escrito, não era nada referido a mim, mas sim a outras pessoas (associados APET) que em Assembleia Geral tomam posições e no terreno negam-nas completamente, através das suas atitudes. O que tenho sobre o assunto a dizer é pouco, entristece-me que se venha para os Facebook's da vida escrever estes desabafos, pois é um caminho que não nos leva a lado nenhum. Há espaços próprios para se tratar dos assuntos e acima de tudo, as pessoas devem quando têm intenções sérias em resolver problemas ou aclarar situações, esclarecer-se antes de opinar seja o que for, pois há sempre metade da história que lhes dá razão e outra metade (a não contada) que lhes tira a razão. Eu não conto histórias, mas a propósito deste assunto e sobre o qual também gastei algum tempo, apenas informo que antes dos festivais postos em causa deste último fim de semana (Carregado e Alandroal), houve pelos menos outros cinco, dos quais apenas tive conhecimento à posteriori da sua realização, pois a sua legalização é efectuada no Fundo de Assistência dos toureiros e daí em diante está tudo 'bem', nem nada nem ninguém tem 'força' para parar seja o que for, cabendo ao bom senso, palavra e idoneidade de cada um, fazer cumprir a palavra e os compromissos assumidos, ou pura e simplesmente porque outros interesses pessoais se levantam, ignorar. Assim e para Vosso conhecimento e dos interessados, houve cinco festivais antes destes dois da polémica (informação fornecida pela ANT) que abaixo indico, com o elenco participante e as empresas promotoras dos mesmos.'

touroeouro
«Rafael Vilhais acusa APET: "Associação de Coveiros da Festa"!» in farpasblogue