quinta-feira, 3 de maio de 2012

O Touro e a Tauromaquia em Portugal

Com tanta informação e movimentos pró e anti touradas o que poderá justificar o redigir de mais um conjunto de artigos sobre o assunto?

Apesar de existir muita informação na Internet, para quem investigue o assunto a fundo, o autor dos textos que se seguem achou que existe uma dispersão muito grande de informação com tendência para a parcialidade exagerada.

O que muitas vezes salta à vista é que não há um esforço de compreensão dos pontos de vista opostos partindo-se para o deboche, radicalismo ou desvalorização dos argumentos do outro lado da barricada. Será que conhecemos todos os argumentos das partes em confronto?

Por outro lado fala-se muito do acto da tourada em si mas e do Touro? O que realmente conhecemos do Touro? Este foi o ponto por onde decidiu começar porque tem a noção de que a maioria das pessoas não conhece o Touro para além da imagem passada por filmes e Touradas.

E assim surgiu a ideia de redigir este dossier que resume ao máximo a imensidão de informação encontrada, e devidamente referenciada, para que rapidamente se possa ter uma visão global de tudo o que envolve esta luta pró vs anti tourada.

Foi tentada a todo o momento a imparcialidade nos textos redigidos apresentando-se factos tais como são. Claro que em alguns trechos surgem alguns apontamentos de opinião, o que é inevitável tendo em conta que no assunto abordado o autor é claramente anti-tourada.

O objectivo deste dossier é o de levar os seus leitores a tomarem ou firmarem a sua posição sobre a Tauromaquia, e em particular a tourada.

Como é importante para enquadramento e para a própria interpretação dos textos fica aqui uma pequena apresentação do autor. Os artigos foram redigidos por Nuno Faria, nascido em 1977, tornado vegetariano em 1997 por convicção própria porque ser defensor dos animais implica a não abertura de excepções mesmo quando por razões alimentares impostas culturalmente. Informático de profissão é o criador do PortugalZoofilo.net em 2005 que procura apoiar a organização de associações de animais abandonados. Acredita que as mudanças devem acontecer organicamente e não ser impostas através de confrontação ou condicionamento. Informar, questionar, levar ao pensamento e a conclusões próprias e individuais são o caminho para a transformação pessoal, local e global.


Conhecer o Touro

No meio da acesa discussão anti e pró tourada muitas vezes centra-se a argumentação em aspectos éticos, políticos, culturais, económicos e sociais esquecendo-se a devida apresentação daquele que deve ser o verdadeiro objecto da discussão: o Touro

O que realmente sabemos sobre os Touros para além de serem um animal possante, de grande envergadura, macho do gado doméstico e utilizado em actividades Tauromáquicas? Quando ouvimos ou pronunciamos a palavra Touro o que mais nos vem à ideia? Um Touro pastando tranquilamente num prado, no seu habitat natural, ou um Touro com uma pose agressiva em combate dentro de uma arena? O mais provavel é que lhe ocorra esta última pois é essa a imagem mais passada nos orgãos sociais onde a palavra Touro está intimamente ligada à Tourada. Se lhe pedirem um sinónimo de Touro provavelmente na maior parte das vezes Besta Negra será dito primeiro do que Boi.

Com este artigo procuro desfazer esta imagem construída pelo marketing da Tauromaquia e fazer um resumo das principais características dos Touros.

Espero que no minímo contenha curiosidades de que não fazia ideia e o faça rever os seus conhecimentos sobre este animal tão mal conhecido pela sociedade.

Aurochs - O Antepassado Comum


Os Grandes Aurochs
Todas as raças, ou sub-especies, de Touros descendem do Auroch, um bovino gigantesco com uma altura de ombros de 2 metros e peso na ordem da tonelada (à esquerda é representado pelo touro a branco comparativamente com um touro contemporâneo e um humano) .

Os Aurochs desenvolveram-se na India há cerca de 2 Milhões de anos, chegaram à Europa há 250 000 anos, e extinguiram-se em 1627.

Grande contributo para a sua extinção foi o facto de devido ao seu porte e capacidade de defesa se ter tornado um alvo popular de desafios de caça. Alvo da caça e considerado concorrente ao gado doméstico não foi capaz de resistir até aos dias de hoje.

A partir desta espécie derivaram muitas outras, como o gado domesticado a surgir há cerca de 8 000 anos. Todas elas têm um porte bastante inferior ao Auroch.

O Touro de Hoje
Touro Adulto


  • Bos Taurus é o nome científico deste mamífero com dieta herbívora.
  • Altura de 1,5 metros.
  • Comprimento de 1,5 a 1,8 metros.
  • Peso típico de 500 Kg a 900 kg (dependendo da subespécie). Mas o recorde de peso de um Touro é de 1 750 kg.
  • Têm aproximadamente 38 litros de sangue no corpo.
  • Velocidade máxima atingida de 40 Km/h.
  • Têm um período de gestação de 9 meses com uma a duas crias. Protegem a sua prole com bravura e fúria cega.
  • Longevidade de 15 a 25 anos, atingindo o seu tamanho máximo com a idade de 2 a 3 anos. A maturidade completa é atingida aos 4 a 5 anos.
  • O registo do bovino a viver com mais idade foi de 49 anos!
  • Vivem em manadas de 40 a 50 elementos com uma hierarquia social bem demarcada existindo um Touro que é o macho dominante.
  • Têm um couro grosso e rijo.
  • Têm um complexo aparelho digestivo com um estômago segmentado em 4 compartimentos que permitem gerar enzimas capazes de digerir substâncias impossíveis de digerir por outros animais.
  • Têm um ângulo de visão de quase 360º e são daltónicos.
  • Conseguem cheirar odores a mais de 8 km de distância.
  • Ouvem frequências mais baixas e mais altas que os humanos.
  • Mastigam na ordem das 50x por minuto atingindo os 400 000 movimentos de mandíbula por dia.
  • Devido à anatomia dos seus joelhos são capazes de subir escadas mas não de as descer.
  • Um animal de 1 tonelada produz 10 toneladas de estrume por ano.
  • Os seus predadores são o homem, os lobos e os ursos.
  • Estima-se que existam no mundo mais de 1.3 biliões de cabeças de gado. Uma pequena parte ainda em estado selvagem.
  • Estima-se que 18% dos gases emitidos que provocam efeito de estufa tenham origem na flatulência e arrotos do gado mundial.
  • Já têm o seu genoma mapeado. Têm 22 000 genes. 80% dos quais partilhados com os humanos. 1 000 partilhados com cães e roedores.
  • Em Portugal praticamente desapareceram as antigas raças de Touro bravos indígenas. Os que hoje pastam nos nossos campos são maioritariamente descendência da casta Andaluza de Vista Hermosa.
  • No passado um Touro era lidado aos 5 anos, idade em que era considerado estar no expoente máximo das suas faculdades: potência, inteligência e resistência. Hoje são-no aos 3 anos, idade em que já atingiram a sua máxima envergadura mas não o pleno da sua maturidade.
  • Com um ano de idade são marcados com ferros em brasa.
  • Com 2 anos as vacas bravas são submetidas ao exame da tenta que procura aferir o grau da sua predisposição e habilidade para a luta. É picada e lidada a cavalo e a pé para provocar reacções em resposta às agressões. As que consideram mais bravas são enviadas para os prados para se reproduzirem as outras seguem para a indústria da carne.
  • Dezenas de milhares de Touros são mortos anualmente em todo o mundo em actividades Tauromáquicas.
  • Existe um Signo do Zodíaco e uma Constelação de Estrelas com o nome Touro.


O Comportamento do Touro

Os ganadeiros e toureiros têm um grande conhecimento sobre o Touro, que é a base da sua actividade, pelo que as descrições mais detalhadas e empíricas sobre Touros são feitas exactamente por agentes da Tauromaquia. Surpreendentemente as suas descrições chegam a ser quase poéticas e com tal nível de detalhe e paixão pelo animal que duvidamos que quem fala assim do Touro possa depois executar e apreciar a sua lide. A título de exemplo veja-se este excerto do ABC da Tauromaquia de El Terrible Pérez onde são reconhecidas várias características ao comportamento/psicologia do Touro que automaticamente o catalogam como um ser senciente completamente consciente do mundo ao seu redor.

Ao contrário do que se pensa, na zoologia o Touro é considerado um animal cobarde, indisposto para a resolução de conflito através da luta. A sua defesa é a fuga sempre que esta lhe seja permitida. Apenas reagem com uma violência e fúria cega em duas situações: 1) para defenderem a sua prole; 2) quando encurralados e agem violentamente como mecanismo de defesa.

A memória dos Touros é sobejamente reconhecida como sendo capaz de recordar eventos que tenham ocorrido há anos. De tal forma que uma das regras da criação de um Touro bravo é a de jamais o castigar com qualquer um dos castigos que lhe serão infligidos no futuro numa arena. Isto porque se o fossem uma única vez deixariam de ter a bravura que demonstram ao reconhecer os instrumentos de tortura usados na lide.

Aliado à sua memória o Touro tem uma alta capacidade de aprendizagem. É por isso que na Tauromaquia proibem, ou desaconselham, que um Touro seja lidado mais do que uma vez. Porque também aprende com as acções dos toureiros o que pode levá-lo a desenvolver ao longo do tempo novas estratégias e movimentos para conseguir colher com sucesso o toureiro. Ou seja pode tornar-se imprevisível para os homens que o lidam.

Em termos de linguagem o Touro tem chamamentos diferentes para exprimir o desejo por uma fêmea, emitir ou responder a um pedido de socorro e preparar-se para a luta.

É muito sensível às temperaturas extremas e procura abrigar-se do frio e chuva bem como do calor para se colocar mais confortável e protegido.

Um Touro revela também simpatia, antipatia ou mesmo empatia. Existem várias histórias de Touros bravos que no seu ambiente natural permitem a aproximação e o toque por parte de crianças. E quando encontra locais aprazíveis deixa-se por aí ficar. Uma história muito conhecida é a do Touro "Gallego" de D. Florentino Sottomayor que foi lidado na praça de Madrid matando um toureiro. Dias antes esse Touro cruzou-se com outro toureiro, a Cavalo, junto a um bebedouro na zona onde era criado. Touro e Cavalo iam competir pelo mesmo bebedouro. O cavaleiro estava receoso do que poderia ocorrer. E eis que o Touro cede passagem ao Cavalo para que este se saciasse primeiro após o que ele próprio foi beber com um ar de satisfação. Dias depois, na arena, esse Touro manso matou.

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